Histórico da Educação Integral no Brasil

A Concepção de Educação Integral - Visão Histórica

    Falar na concepção de Educação Integral nos remete a muitas reflexões, entre elas, o que é Educação Integral propriamente dita e o que é educação em tempo integral?  Precisamos ter claro com que objetivos esta nova modalidade da educação está sendo implantada, o que as políticas públicas dizem a respeito deste programa, e quais as possibilidades de implementação de um novo currículo nas escolas em tempo integral. Para responder algumas das questões levantadas remetemo-nos ao que nos dizem as legislações vigentes no histórico da educação integral.

    A Constituição de 1988, art. 205, garante a “Educação como direito de todos e dever do estado e da família, sendo promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa” (BRASIL, 2009, p. 21), ou seja, a Educação visa formar o cidadão em toda sua integridade, todas as suas habilidades e potencialidades. Para tanto, a família e o estado devem garantir este direito.

    Mesmo antes da Constituição de 1988, educadores já se preocupavam com a qualidade da educação e a necessidade de reestruturar a escola, no contexto brasileiro. A experiência de escola de tempo integral chegou ao Brasil no contexto do movimento de renovação da escola na primeira metade do século XX, sendo um dos precursores Anísio Teixeira, educador que participou ativamente dos embates políticos e educacionais da época, estando presente nos estudos sobre a Educação Integral. Ele argumentava que a formação de todos os brasileiros, para os diversos níveis de ocupações de uma democracia, passa pela relação entre qualidade e acesso aos sistemas públicos educacionais.

    Após a ditadura militar, a década de 80 foi marcada por experiências de escola pública de tempo integral, com iniciativas governamentais, que começaram a reorganizar o sistema educacional de seus estados. Nesta década, inspirado por Anísio Teixeira, Darci Ribeiro apresenta a experiência dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), no Rio de Janeiro, que constituem-se como “uma das mais polêmicas implantações da Educação Integral realizada no país” (BRASIL, 2009, p. 16). Este mesmo documento afirma que “vários estudos foram realizados sobre essa implantação, apresentando seus aspectos inovadores e também suas fragilidades ”.

    A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) faz alusões à escola de tempo integral no artigo 34: “a jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola”. Inciso 2º “O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a critério dos sistemas de ensino”.

    Na Lei 10.172/2001 que criou o Plano Nacional de Educação (PNE), destinada ao Ensino Fundamental, encontramos além da reafirmação do aumento da jornada escolar, uma primeira definição para tempo integral, expressa em um dos objetivos e metas traçados pelo referido plano. Sua meta 21 pretende “Ampliar, progressivamente a jornada escolar visando expandir a escola de tempo integral, que abranja um período de pelo menos sete horas diárias, com previsão de professores e funcionários em número suficiente”.

    O PNE (2001-2010) apontou a ampliação da jornada escolar como um avanço significativo para diminuir as desigualdades sociais e ampliar democraticamente as oportunidades de aprendizagem.

    Em 2007 foi apresentado pelo Ministério da Educação e Cultura, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Parte importante do PDE, o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, instituído pelo Decreto nº 6.094, propõe diretrizes para a ampliação da jornada escolar, considerada como uma das ferramentas para reduzir e combater a evasão e repetência na escola. No artigo 2º, deste documento, são apresentadas as diretrizes voltadas à ampliação do tempo de aprendizagem dos alunos e à qualificação dos processos de ensino, com a participação dos alunos em projetos socioculturais e em ações educativas.

    Outro elemento relevante do PDE é a Lei nº 11.494/2007. Ela institui o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), que vislumbra um volume dez vezes maior de recursos do governo federal para a Educação Básica.

    Para operacionalizar as diretrizes do PDE foi instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007, o Programa Mais Educação, cujo “objetivo é fomentar a Educação Integral de crianças, adolescentes e jovens por meio de atividades socioeducativas, articuladas ao Projeto Político Pedagógico das escolas” (BRASIL, 2011, p. 7).  Este programa faz parte de mais uma tentativa de garantir o direito a educação de qualidade, assim como dos demais direitos humanos e sociais, articulando os processos escolares com outras políticas sociais, na perspectiva de garantir o sucesso escolar e a formação de cidadãos em sua complexidade através da Educação Integral em tempo integral.

    Dentre os objetivos do Programa Mais Educação está destacada a ampliação dos tempos, dos espaços e dos conteúdos educativos dentro e fora da escola. Para complementar, o decreto 7.083, de janeiro de 2010, apresenta no artigo 2º, como princípio da Educação Integral, “a constituição de territórios educativos para o desenvolvimento de atividades de educação integral, por meio da integração dos espaços escolares com equipamentos públicos como centros comunitários, bibliotecas públicas, praças, parques, museus e cinemas”, assim como, “o incentivo à criação de espaços educadores sustentáveis com a readequação dos prédios escolares” (BRASIL, 2010)

    O governo federal, através do PNE, do PDE e mais especificamente, do Programa Mais Educação estabelece políticas de apoio e incentivo à ampliação gradativa da jornada escolar com a participação de diferentes ministérios, seguindo critérios de urgência de implementação, de acordo com as diferentes realidades dos municípios brasileiros.

    Desta forma percebemos o quanto a ampliação dos espaços é central nas políticas públicas, sendo caracterizado como território educativo. Anísio Teixeira já descrevia o Parque-escola (conjunto de espaços possíveis ao entorno da escola), na perspectiva da ampliação de territórios educativos.

    Dando sequência a pesquisa referente às políticas públicas, atualmente está em tramitação no Congresso Nacional o Plano Nacional de Educação (2011-2020). Este plano propõe entre suas metas, além da alfabetização de todas as crianças até os oito anos de idade, ou seja, ao final dos três primeiros anos do ensino fundamental, a oferta progressiva de Educação Integral em 50% das escolas públicas em Educação Básica, apresentando seis estratégias específicas, que como afirma Jaqueline Moll “certamente, serão foco de muitos debates no processo em curso no Congresso Nacional” (MOLL, 2012, p. 136).

    Hoje se assiste a retomada da proposta de escola de tempo integral, por governos estaduais e municipais como solução para o enfrentamento dos graves problemas educacionais, como: a dificuldade na alfabetização, reprovação e evasão dos alunos, acompanhadas da distorção idade/ série, entre outros.

    Embora ainda não esteja formalizada a definição de Educação Integral, ela está sendo caracterizada como uma formação do ser humano “o mais completa possível”. O que seria esta formação ou como esta aconteceria não está claro nos documentos legais. De acordo com o documento “Educação Integral: Texto-referência para o debate Nacional” (BRASIL, 2009, p. 18) “falar sobre Educação Integral implica, então, considerar a questão das variáveis tempo, com referência à ampliação da jornada escolar, e espaço, com referência aos territórios em que cada escola está situada (grifos do autor).”

    Levando em consideração a preocupação com a qualidade da Educação, as condições de vida das crianças oriundas da periferia da cidade, referente ao acesso à cultura e lazer, ao processo de construção do conhecimento, acredito que a proposta da Educação Integral poderá possibilitar um avanço significativo no processo ensino-aprendizagem, na formação da criança integral e integralmente, desde que realmente promova um trabalho sério, que busque valorizar as necessidades da criança enquanto um ser biopsicossocial (completo), favorecendo sua inserção na cultura de forma crítica e participativa.

 

 

Referências:

 

BRASIL. Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1998. Disponível em: <HTTP://www.planalto.gov.br/ccvil_03/Constituição/Constituição.htm>. Acesso em: 15 fev. 2012.

______. Decreto 6094 de 24 de abril de 2007 – dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. Diário Oficial da União, Brasília, 2007. Disponível em: <HTTP://www.planalto.gov.br/ccvil_03/Ato2007-2010/2007/Decreto/D6094.htm> Acesso em: 10 de mar. de 2012.

______. Decreto 7.083 de 27 de janeiro de 2010 - dispõe sobre o Programa Mais Educação. Diário Oficial da União, Brasília, 2010. < Disponível em: HTTP://www.planalto.gov.br/ccvil_03/_ato2007-2010/2010/.../d7083.htm>. Acesso em: 10 de mar. de 2012.

______. Lei 8069 de 13 de julho de 1990 – institui o Estatuto da Criança e do Adolescente. Diário Oficial da União, Brasília: 1990. Disponível em: <HTTP://www.planalto.gov.br/ccvil_03/Leis/L8069.htm>. Acesso em: 15 de fev. de 2012

______. Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996 – estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília: 1996. Disponível em: <HTTP://www.planalto.gov.br/ccvil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 15 de fev. de 2012

______. Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001 - Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Brasilia: 2001. Diário Oficial da União, Disponível em: <HTTP://www.planalto.gov.br/ccvil_03/leis/leis_2001/l10172.htm>. Acesso em: 05 de mar. de 2012.

______. Ministério da educação. Caminhos para elaborar uma proposta de Educação Integral em jornada ampliada. Brasília: SEB/MEC, 2011. (versão preliminar)

______. Ministério da educação. Educação Integral: Texto-referência para o debate Nacional.  Brasília: MEC, 2009.

______. Programa Mais Educação – Passo a Passo. Brasília: MEC/SECAD, sd.

______. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: Introdução. v. I. Brasília: MEC/SEF, 1998.

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CAVALIERE. A. M. Escolas de tempo integral versus alunos em tempo integral. Em Aberto. Brasília, v. 22, n. 80, p. 51-63, abr. 2009.

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GUARÁ, I. M. F. R. É imprescindível educar integralmente. Caderno CENPEC, nº  2, 2006. p. 15-24.

MOLL, J. A agenda da educação integral: compromissos para sua consolidação como política pública. In: MOLL, J. et alii. Caminhos da educação integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012. p. 129- 146.

NILSON, L. H. Intersetorialidade e contextos educacionais. In: TV Escola -  Salto para o futuro: Educação Integral e Intersetorialidade. Brasília: MEC/SED,  ano XIX, nº 13, out. 2009. p. 22-28. Disponível em:     IntegralInter.pdf>Acesso em: 18 de mar. de 2012.

 

 

 

ARTIGO 

Entre os dias 26/08 e 02/09 de 2011 aconteceu o Ciclo de Debates sobre a história de Educação Integral no Brasil na UFSC _ Universidade Federal de Santa Catarina. Entre os convidados estava a doutora Lúcia Velloso Maurício que abordou em sua explanação "Literaturas e Representações da Escola Pública de Horário Integral". A mediação ficou por conta da professora da UFSC, doutora Ilana Laterman.

No endereço abaixo encontre o artigo da pesquisadora e boa leitura.  https://www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a03.pdfhttps://www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a03.pdfhttps://www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a03.pdf 

https://www.scielo.br/pdf/rbedu/n27/n27a03.pdf